Recebendo os chefes de governo da Albânia, Bósnia e Herzegovina, Kosovo, Macedónia do Norte, Montenegro e Sérvia, o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, reavivou o papel de Londres como actor central na região
Do nosso correspondente – A cimeira do Processo de Berlim realizada ontem, quarta-feira, 22 de Outubro, em Londres, confirmou o compromisso do Reino Unido com a região dos Balcãs Ocidentais, não apenas como espaço de intervenção diplomática multilateral para apoiar o caminho de integração europeia dos países candidatos, mas também como campo de acção privilegiado para as estratégias britânicas em matéria de migração, segurança e contenção de influências geopolíticas adversárias. Recebendo os chefes de governo da Albânia, Bósnia e Herzegovina, Kosovo, Macedónia do Norte, Montenegro e Sérvia, o Primeiro-Ministro britânico Keir Starmer reavivou o papel de Londres como actor central nos Balcãs. Durante a abertura da cimeira, Starmer definiu a região como “o caldeirão da Europa”, sublinhando que aqui a estabilidade e a segurança do continente são testadas. O primeiro-ministro enfatizou três prioridades: a segurança, a luta contra a migração irregular e o crescimento económico, com especial atenção também ao combate à “influência maligna” da Rússia.
O dossiê da migração representa a questão mais sensível para Londres. Com o aumento das chegadas através do Canal da Mancha e a crescente pressão sobre a opinião pública interna, o governo britânico intensificou as negociações com vários países dos Balcãs para acolher os chamados centros de repatriamento: estruturas onde os requerentes de asilo cujos pedidos foram rejeitados podem ser temporariamente colocados antes da sua deportação definitiva. O Kosovo teria manifestado vontade de discutir a proposta, enquanto as posições de países como a Albânia e o Montenegro são de opinião oposta – ou quase oposta. Durante um evento realizado em Chatham House, com a presença também dos primeiros-ministros de Tirana e Podgorica, Edi Rama e Milojko Spajicsurgiram as posições dos dois países. De facto, em mais de uma ocasião Rama reiterou ao seu homólogo Starmer que não tinha intenção de “replicar” o modelo de cooperação assinado com a Itália no dossiê da migração. Do Montenegro, porém, emerge uma oposição “parcial” que poderá ser superada se investimentos importantes vierem do Reino Unido, particularmente no sector das infra-estruturas de transportes.
Ao mesmo tempo que a cimeira, o governo britânico anunciou novas sanções contra redes criminosas baseadas nos Balcãs Ocidentais, acusadas de facilitar o tráfico de seres humanos ao longo das rotas migratórias. Segundo dados divulgados pelo Itamaraty, só em 2024 cerca de 22 mil pessoas teriam entrado ilegalmente no Reino Unido por essas rotas. As medidas lançadas visam figuras-chave do tráfico: líderes de gangues, falsificadores, financiadores. Entre os sancionados estão a rede criminosa Kosovar “Krasniqi”, responsável pela produção de passaportes falsos, e a empresa Alpa Trading Fzco, suspeita de gerir fundos em nome de traficantes. “Não queremos ver estes bandos a operar no nosso território e todos nós sofremos as consequências das suas ações”, declarou Starmer na cimeira, alegando também o sucesso da cooperação bilateral com a Albânia, que levou – segundo Downing Street – a uma redução de noventa e cinco por cento nas chegadas através de pequenos barcos daquele país.
Mas a estratégia britânica nos Balcãs vai além da questão da migração. Londres continua a considerar a região um centro geopolítico fundamental para a segurança europeia e para a contenção das ambições russas. A proximidade histórica entre Moscovo e Belgrado, bem como a crescente influência económica da China e da Turquia, levam o Reino Unido a manter uma presença activa e multifacetada. O reforço do apoio à missão NATO KFOR no Kosovo, anunciado no mesmo dia da cimeira, enquadra-se neste sentido. O Ministério da Defesa britânico reafirmou o compromisso operacional e político do Reino Unido com a força internacional, que continua a ser um elemento crucial de estabilização no contexto Kosovar, especialmente após as recentes tensões entre Pristina e Belgrado. O comunicado divulgado a partir de Londres sublinha que a presença militar britânica “contribui diretamente para a segurança e dissuasão regional” e que “a estabilidade do Kosovo é fundamental para toda a região dos Balcãs Ocidentais”.
A abordagem britânica também se distingue por uma clara projeção autónoma em comparação com a União Europeia. Ao mesmo tempo que apoia o caminho de integração dos Balcãs na UE – tal como previsto pelo próprio Processo de Berlim – o Reino Unido pretende reforçar as relações bilaterais diretas, livres do quadro regulamentar de Bruxelas. Esta abordagem pós-Brexit traduz-se em acordos específicos, investimentos estratégicos, intercâmbio de informações e cooperação em políticas de regresso. Londres pretende assim continuar a ser um actor central numa região que define como “essencial” para a segurança de toda a Europa. Em causa não estão apenas os fluxos migratórios, mas também a estabilidade da arquitectura euro-atlântica numa das zonas mais frágeis do continente, actualmente contestada entre a influência ocidental e a interferência externa. Em conclusão, a cimeira de Londres ofereceu uma imagem clara da estratégia britânica nos Balcãs: dissuasão migratória, contenção geopolítica da Rússia, projecção de poder brando através de sanções específicas e ferramentas de cooperação. Embora a União Europeia continue a ser o ponto de referência para as aspirações de integração, o Reino Unido pretende ser o parceiro de segurança mais reativo e pragmático em toda a região.