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Halloween, a noite das bruxas: origens, significado e como o feriado chegou a Portugal

Nas últimas décadas, o Halloween em Portugal tem vindo a ganhar cada vez mais popularidade, passando de uma curiosidade importada dos Estados Unidos para se firmar no calendário das celebrações nacionais. No entanto, o fenómeno, pelo menos em Portugal, não resulta de uma simples cópia: o Halloween é o resultado de um encontro entre hábitos estrangeiros e antigas tradições locais, um percurso cultural marcado pela contaminação e pela reinterpretação.

Se até há poucos anos o dia 31 de Outubro era considerado a simples véspera do Dia de Todos os Santos, dedicado sobretudo à memória dos falecidos, hoje a noite de Halloween rivaliza, e por vezes supera, as práticas mais tradicionais. Famílias e amigos reúnem-se, as crianças vestem-se de bruxas e fantasmas e as cidades enchem-se de eventos, festas e decorações com sabor internacional. Por trás deste festival, porém, existe uma história intrincada que une cinema, televisão, rituais rurais e a necessidade universal de celebrar a comunidade.

Uma prateleira forrada a juta com algumas castanhas assadas, muito comuns no Halloween em Portugal. Você pode ver uma estrada fora de foco ao fundo com os pés de uma pessoa e um pequeno bichinho de pelúcia em uma caixa de madeira.

A influência dos media americanos: a viagem do Halloween a Portugal

O sucesso do Halloween em Portugal está indissociavelmente ligado à influência do cinema e da televisão americanos. Foi já durante os anos da Guerra Fria que imagens de abóboras esculpidas, fantasias perturbadoras e crianças batendo às portas pedindo “gostosuras ou travessuras” começaram a ser trazidas para os lares portugueses. A globalização da mídia desempenhou um papel decisivo, transformando o Halloween de uma curiosidade estrangeira em um ícone pop. Inicialmente, de facto, esta “importação cultural” viajou lentamente: primeiro as grandes cidades, depois os contextos periféricos, receberam e reinventaram o festival segundo os seus próprios ritmos. Tudo isto num processo de mediação que permitiu ao Halloween fundir-se com as tradições locais também em Portugal.

Raízes portuguesas: culto aos mortos e festas das colheitas como em Itália

Embora o Halloween seja universalmente reconhecido como essencialmente americano, as suas raízes – o culto aos mortos, a celebração da colheita, a socialização comunitária – sempre fizeram parte da cultura portuguesa. No período próximo do dia 1 de novembro, a tradição nacional convida-nos a homenagear os falecidos, visitar cemitérios, acender velas e partilhar a memória dos entes queridos.

Mas a verdadeira peculiaridade de Portugal é a antiga magustoconsiderado por muitos um “Halloween português”. Comemorado no dia 11 de novembro, dia de São Martinho, o magusto marca o fim da colheita de outono e o início do inverno. À volta das fogueiras, famílias e amigos reúnem-se para assar castanhas, provar o primeiro vinho da época e partilhar histórias. O fogo de São Martinho simboliza o calor humano, o convívio e a celebração comunitária. Esses valores, hoje, também vivem no Halloween contemporâneo.

Pão por Deus: a sobremesa portuguesa

Ao lado do magusto, uma tradição que merece ser contada é a pão por Deus. Celebrado no dia 1º de novembro, esse antigo costume faz com que as crianças vão de porta em porta pedindo pão, doces e frutas secas, cantando canções infantis e versos dedicados aos falecidos. “Pão por Deus, fiel de Deus, Bolinho no saco, fui com Deus”diz uma das fórmulas mais conhecidas.

O pão por Deus tem origem no século XV, quando a comida era partilhada como forma de oração pelas almas. Após o terramoto de 1755, a tradição fortaleceu-se especialmente entre os grupos mais humildes de Lisboa, tornando-se um momento de solidariedade e ajuda mútua. Ainda hoje, especialmente nas zonas rurais de Portugal, esta celebração mantém seu valor familiar e religiosodistinguindo-se do espírito mais lúdico e comercial do Halloween.

Halloween nas escolas: uma nova tradição

As escolas em Portugal foram o verdadeiro motor da integração do Halloween. As celebrações, muitas vezes apoiadas por professores de inglês, permitiram que as crianças se aproximassem dos costumes anglo-saxónicos de uma forma alegre e criativa. A festa lembra em parte o Carnaval, oferecendo a oportunidade de fantasiar-se, participar de jogos educativos, oficinas artísticas e momentos de socialização. Os pais, por sua vez, começaram a apoiar o Halloween, ansiosos por oferecer aos filhos experiências diferentes e partilhadas.

Uma professora do ensino primário de Albufeira confirma-nos na Leggo Algarve: “É um encontro muito festejado nas escolas do primeiro ciclo. Os alunos pedem para se fantasiar, os pais organizam festas e as atividades giram em torno do aprendizado do vocabulário e da criatividade em inglês. Hoje o Halloween é mais do que um feriado importado: é um espaço de educação, integração e expressão cultural.”

Halloween na cidade e no campo: duas almas comparadas

A difusão do Halloween em Portugal não é homogénea. Nas grandes cidades, a pressão comercial, a presença social da mídia e das escolas favorecem o enraizamento do feriado americano. Locais, lojas e shopping centers oferecem eventos temáticosenquanto as praças ficam repletas de máscaras e espetáculos.

Duas pessoas com fantasias elaboradas de Halloween, uma como um ceifador e outra como uma figura gótica com uma caveira vermelha, ficam em frente a um edifício branco à noite, bem iluminado, capturando o espírito misterioso do Halloween em Portugal.Duas pessoas com fantasias elaboradas de Halloween, uma como um ceifador e outra como uma figura gótica com uma caveira vermelha, ficam em frente a um edifício branco à noite, bem iluminado, capturando o espírito misterioso do Halloween em Portugal.

No sertão, porém, a resistência é mais forte: as famílias reservam o período de Todos os Santos para visitas a cemitérios, ao magusto e às tradições locais. A vontade de preservação do património histórico, aliada à recuperação dos valores comunitários e solidários, dá origem a celebrações menos vistosas mas profundamente sentidas.

As raízes simbólicas da celebração: identidade e convívio

A história do Halloween em Portugal é a história de uma festa que soube transformar-se e adaptar-se, sem nunca desvirtuar o seu espírito. Por trás das máscaras, das abóboras e dos doces, reconhecemos os temas universais que unem as celebrações em todo o mundo. A memória dos falecidos, a festa da colheita, momentos de convívio e partilha. O que chama a atenção, em particular, é a capacidade das gerações jovens de reinterpretar símbolos antigos com novas linguagens, criando pontes entre o passado e o presente.

Do Halloween aos festivais de bruxas na Itália: semelhanças e diferenças

A ligação entre as tradições portuguesa e italiana manifesta-se também na forma como o medo, a magia e o mistério são celebrados. Na Itália, vários festivais ligados ao mundo das bruxas testemunham uma cultura rica em símbolos mágicos e rituais coletivos.

Estes feriados italianos, como o Halloween em Portugal, estão enraizados na necessidade de exorcizar o medo, celebrar as mudanças sazonais e fortalecer os laços comunitários.

Uma cena noturna ao ar livre em Vilar de Perdizes mostra um grupo de pessoas reunidas perto de um edifício iluminado e de uma grande estátua; Ramos frondosos enquadram o topo da imagem, evocando a celebração do Halloween em Portugal.Uma cena noturna ao ar livre em Vilar de Perdizes mostra um grupo de pessoas reunidas perto de um edifício iluminado e de uma grande estátua; Ramos frondosos enquadram o topo da imagem, evocando a celebração do Halloween em Portugal.

Halloween e tradições locais: uma fusão frutífera

A versão portuguesa do Halloween é, em suma, o resultado de uma mistura cultural em que se encontram a globalização, a educação escolar, os rituais religiosos e o convívio rural. Cada região, cidade e aldeia preserva variações, costumes e rituais, ligando a festa às grandes celebrações do calendário nacional, como o Dia de Todos os Santos, o Dia de São Martinho e o Pão por Deus.

De norte a sul, o Halloween em Portugal assume mil faces: nas cidades o ritmo da contemporaneidade é forte, entre as redes sociais e as compras; as palavras das avós e antigas canções infantis ressoam no campo.

Entre a memória e a inovação, o importante é que a festa continue

Hoje em dia, o calendário lusitano enriquece-se de experiências, cores e histórias, lembrando a todos que celebrar – nas suas infinitas formas – é uma prática antiga, necessária e, acima de tudo, partilhada. O Halloween em Portugal deixou de ser apenas um “feriado importado”: ​​tornou-se parte integrante da cultura nacional, contaminada, reinventada e valorizada pelas novas gerações. As raízes profundas do culto aos mortos, da colheita e da partilha coexistem com a criatividade e a imaginação da contemporaneidade, oferecendo aos residentes italianos e a todos os curiosos uma oportunidade de redescobrir o valor das celebrações colectivas.

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Beatriz Marques
Beatriz Marques
Como redatora apaixonada na Rádio Miróbriga, me esforço todos os dias para contar histórias que ressoem com a nossa comunidade. Com mais de 10 anos de experiência no jornalismo, já cobri uma ampla gama de assuntos, desde questões locais até investigações aprofundadas. Meu compromisso é sempre buscar a verdade e apresentar relatos autênticos que inspirem e informem nossos ouvintes.