Você já imaginou viver num mundo onde o ar-condicionado funciona sem nem precisar de eletricidade? Parece roteiro de ficção científica, mas é pura ciência misturada com uma pitada daquele sonho de verão – literalmente!
Quando o calor aperta e a conta de luz espanta
Não é segredo para ninguém: cada ano que passa, o planeta fica mais quente e as ondas de calor batem recordes atrás de recordes. Para aguentar, muita gente depende de aparelhos de ar-condicionado cada vez mais potentes – e cada vez mais sedentos por energia. Só que enquanto uns suam só de olhar para a conta de luz, outros nem sequer têm acesso à eletricidade. Estima-se que mais de 700 milhões de pessoas ainda vivem nessas condições pelo mundo, principalmente em regiões muito quentes e ensolaradas. Fala sério, não está fácil para ninguém, não!
Daí apareceu uma ideia que parece saída de uma história de outro planeta: um sistema de resfriamento passivo que usa água salgada e o calor do sol como aliados para esfriar o ambiente – sem eletricidade.
O segredo está no sal: ciência por trás do milagre
Vamos lá, turma da ciência: prepare-se para uma leve viagem ao universo dos fenômenos naturais. O truque desse novo sistema criado por pesquisadores da Universidade Rei Abdullah de Ciência e Tecnologia (KAUST), da Arábia Saudita, é aproveitar o chamado “mudança de fase” de certos sais quando dissolvidos na água.
- Ao se dissolverem, os cristais de sal absorvem energia do ambiente externo – a famosa reação endotérmica, que suga calor do que está ao redor.
- Basta adicionar sal à água quente e pronto: a água esfria rapidamente enquanto o sal se desfaz.
Mas não é qualquer sal que serve para a mágica acontecer. Depois de muitos testes (e algumas pitadas bem generosas), os pesquisadores concluíram que o campeão do resfriamento é o nitrato de amônio (NH4NO3).
- Altamente solúvel: até 1180 g/L a 0°C ou 8710 g/L a 100°C!
- Quatro vezes mais eficiente no resfriamento do que o próximo colocado, o cloreto de amônio.
- Barato, fácil de armazenar, já usado como fertilizante e em misturas refrigerantes.
Do laboratório à prática: como funciona esse ar-condicionado sem fio?
Liderada pelo professor Peng Wang, a equipe testou o poder do nitrato de amônio em experiências reais. Eles colocaram uma mistura de água e esse sal num recipiente metálico, que foi depois isolado dentro de uma caixa de isopor (sim, o mesmo material das caixas de cerveja de praia!). O resultado espantou até quem já estava otimista:
- Em cerca de 20 minutos, a temperatura despencou de 25°C para 3,6°C.
- O recipiente ficou abaixo dos 15°C por mais de 15 horas consecutivas!
Segundo o time do NESCOD (No Electricity and Sustainable Cooling On-Demand), essa engenhoca pode entregar até 191 W.m-2 de resfriamento. Serve para casas, claro, mas também pode ser adaptada para conservar alimentos, por exemplo.
Quando todo o sal dissolve, entra em cena o sol: o calor solar evapora a água e permite recuperar os cristais de sal para reuso. Tudo bem pensado para ser ecológico e possível reutilizar tanto o sal quanto a água (nada de desperdício, principalmente onde o líquido precioso vale ouro!). Segundo os pesquisadores, usar um destilador solar pode garantir a quase total reutilização da água.
O dilema global: quem vai esfriar o planeta?
Hoje, o consumo de energia dos ares-condicionados beira 9% de toda a eletricidade produzida no mundo – e pode chegar a 20% até 2050. É isso mesmo: só para refrescar nossos espaços! Nos EUA, quase 90% dos lares têm ar-condicionado e, pasme, os americanos gastam mais energia nisso do que o resto do planeta inteiro. Na China, as vendas desses aparelhos saltaram de 8% para 70% das casas urbanas entre 1995 e 2004 e só aumentam.
Com o aquecimento global, o boom dos sistemas de resfriamento é inevitável. Mas como fazer isso de forma acessível para todo mundo – inclusive os 700 milhões sem eletricidade? Os sistemas caros e dependentes de energia não chegam até eles. Surgem aí as invenções como a do NESCOD: baratas, sem fio, sem emissão de CO2 e muito bem-vindas nestes tempos de calor escaldante.
Em resumo: a mistura de ciência e criatividade continua sendo nossa melhor aposta contra o calor. Se o verão vier com tudo, lembre-se: o futuro do ar-condicionado já está a caminho, e pode estar mais próximo de um copo d’água salgada do que você imagina!